terça-feira, 22 de julho de 2014

Agências Reguladoras - coletânea (Artigo / Lei / Doutrina)

AGÊNCIAS REGULADORAS: A «METAMORFOSE» DO ESTADO E DA DEMOCRACIA
(Uma Reflexão de Direito Constitucional e Comparado)
Joaquim B. Barbosa Gomes
 (Recorte dos pontos principais, na visão de Ana Claudia Custódio)

            No Direito brasileiro, agência reguladora é uma autarquia especial, criada por lei, também com estrutura colegiada, com a incumbência de normatizar, disciplinar e fiscalizar a prestação, por agentes econômicos públicos e privados, de certos bens e serviços de acentuado interesse público, inseridos no campo da atividade econômica que o Poder Legislativo entendeu por bem destacar e entregar à regulamentação autônoma e especializada de uma entidade administrativa relativamente independente da Administração Central.

            Por serem autarquias, devem ser criadas por lei, como determina o art. 37, XIX da Constituição Federal. Em razão do princípio da simetria, sua extinção também só pode se dar através de lei específica e por motivos de interesse público.

            Não se deve confundir com Agência Executiva que é uma Autarquia ou Fundação Pública dotada de regime especial graças ao qual ela passa a ter maior autonomia de gestão do que a normalmente atribuída às autarquias e fundações públicas comuns. Trata-se em realidade de uma qualificação jurídica que pode ser dada a uma autarquia ou fundação, ampliando-lhe a autonomia gerencial, orçamentária e financeira, devendo a entidade firmar contrato de gestão com a administração central, no qual se compromete a realizar as metas de desempenho que lhe são atribuídas.

Importante!
Já a Agência Reguladora («Independent Regulatory Commission», na terminologia mais usual do direito dos EUA) é uma entidade administrativa autônoma e altamente descentralizada, com  estrutura colegiada, sendo os seus membros  nomeados para  cumprir um mandato fixo do qual eles  só podem ser exonerados em caso de deslize administrativo ou falta grave («for cause shown»). A duração dos mandatos varia de agência para agência e não raro é fixada em função do número de membros do colegiado, de sorte que os membros de uma agência composta de cinco Diretores («Commissioners») terão mandatos de cinco anos escalonados de tal maneira que haja uma vacância a cada ano. A nomeação, inclusive a do presidente do colegiado («Chairman»), cabe ao Chefe do Executivo com prévia  aprovação do Senado.

Natureza Jurídica das Agências Reguladoras – No plano jurídico formal, as agências brasileiras nada mais são, pois, do que as velhas e conhecidas autarquias, pessoas jurídicas de direito público, agora com nova roupagem e dotadas de um grau maior de independência em relação ao poder central, daí a qualificação de «especial» que lhes é conferida pela lei[1]. Segundo a Professora  Maria Sylvia Di Pietro, as agências estão sendo criadas como autarquias de regime especial porque “sendo autarquias, sujeitam-se às normas constitucionais que disciplinam esse tipo de entidade; o regime especial vem definido nas respectivas leis instituidoras, dizendo respeito, em regra, à maior autonomia em relação à Administração Direta; à estabilidade de seus dirigentes, garantida pelo exercício de mandato fixo, que eles somente podem perder nas hipóteses expressamente previstas, afastada a possibilidade de exoneração ad nutum; ao caráter final de suas decisões, que não são passíveis de apreciação por outros órgãos ou entidades da Administração Pública.”

Gênese das Agências Reguladoras
(...)
        No Brasil, que também pertence a essa última família jurídica, embora com cada vez mais numerosos elementos do sistema da common law, elas aportam na segunda metade dos anos 90, no bojo do processo de desengajamento do Estado da prestação direta de vários serviços públicos.

       Com efeito, no seu Título VII,  a Constituição de 1988 dispõe  sobre a ordem Econômica e Financeira, disciplinando especialmente  o papel do  Estado como agente normativo e regulador e como  executor subsidiário de atividades econômicas. Dispõe ainda sobre a possibilidade de transferência à iniciativa privada da prestação de alguns serviços  que durante muito tempo estiveram sob controle estatal. No plano infraconstitucional, a Lei 8987/95, regulamentando o mencionado artigo 175 da CF/88, trouxe novas regras sobre o regime de concessões e permissões de serviços públicos. Com fundamento na nova ordem constitucional e legal, foram editadas as leis 9427/96, 9472/97 e 9478/97 que criaram respectivamente a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) e Agência Nacional do Petróleo (ANP), às quais foi transferida a atribuição regulatória dos  setores de energia elétrica, das telecomunicações e do petróleo[2]. Posteriormente, a lei 9782/99 criou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, prenunciando, assim, a exemplo do que ocorreu nos EUA e em outros países, um movimento de expansão dessas entidades, que  passam a ter poder de intervenção nos mais diversos setores em que se faz necessária a presença reguladora e disciplinadora do Estado, e não apenas nas áreas de atividade econômica outrora monopolizadas pelo poder público.

            As agências podem ser criadas  tanto em âmbito federal quanto na esfera estadual, com o objetivo de regular a prestação por operadores privados de serviços públicos delegados à iniciativa privada. A reprodução dessa tendência regulatória  tem seguido dois modelos: de um lado, o “modelo setorial  especializado”, em que  são criadas diversas agências, uma para cada setor (como no caso das agências federais supramencionadas); e o “modelo multissetorial”, em que se cria apenas uma agência incumbida da regulação de todos os serviços públicos prestados por particulares, como é o caso do Estado do Rio de Janeiro, onde foi criada a ASEP-RJ (Agência Reguladora de Serviços Públicos), responsável pela fiscalização e regulação de todos os serviços públicos objeto de concessão ou permissão pelo Estado

Estrutura organizacional, atribuições e modo de funcionamento das agências

Em linhas gerais, pode-se dizer que, no aspecto organizacional, o legislador brasileiro foi bastante tímido ao estabelecer o figurino institucional e o modus operandi das nossas  agências reguladoras. Com efeito, constata-se que pouco se ousou nesse campo quando se confrontam os novos entes com os seus similares do direito comparado.
As leis que criaram as primeiras agências reguladoras grosso modo estabeleceram que as agências:
·         são  dirigidas por um Diretor-Geral e por  outros tantos diretores, os quais atuarão sob regime de colegiado;
·         tem um Ouvidor, a cargo de quem fica a incumbência de zelar pela qualidade do serviço prestado pelas empresas privadas bem como de solucionar eventuais problemas e reclamações dos consumidores e usuários do serviço;
·         o.Diretor-Geral é nomeado pelo Presidente da República, após aprovação da escolha pelo Senado Federal, com apoio no permissivo constitucional do  art. 52, III, “f”, da Constituição de 1988 e das leis de criação das agências.

A «independência» das Agências – A idéia fundamental que norteou o surgimento das agências reguladoras foi a de se criar um ente administrativo  técnico, altamente especializado e sobretudo imperméavel às injunções e oscilações típicas do processo político, as quais, como se sabe, influenciam sobremaneira as decisões  dos órgãos situados na cadeia hierárquica da Administração. Para tanto, concebeu-se um tipo de entidade que, embora mantendo algum tipo de vínculo com a Administração Central, tem em relação a ela um acentuado grau de autonomia. Resta saber, precisamente, em que consiste essa autonomia. O Prof. Diogo de Figueiredo Moreira Neto aponta, com a acuidade de sempre, quatro aspectos fundamentais dessa autonomia, sem os quais “qualquer ente regulador que se institua não passará de uma repartição a mais na estrutura hierárquica do Poder Executivo, pois estará impossibilitado de executar a política legislativa do setor, como se pretende que deva fazê-lo”. São eles:
(a) a independência política dos gestores, que “decorre da nomeação de agentes administrativos para o exercício de mandatos a termo, o que lhes garante estabilidade nos cargos necessários para que executem, sem ingerência política do Executivo, a política estabelecida pelo Legislativo para o setor
(b) a independência técnica decisional, que assegura a atuação apolítica da agência, “em que deve predominar o emprego da discricionariedade técnica e da negociação, sobre a discricionariedade político-administrativa;
(c) a independência normativa, “um instituto renovador, que já se impõe como instrumento necessário para que a regulação dos serviços públicos se desloque dos debates político-partidários gerais para concentrarem-se na agência”; e
(d) a independência gerencial, financeira e orçamentária, que “completa o quadro que se precisa para garantir as condições internas de atuação da entidade com autonomia na gestão de seus próprios meios”.

Dispõe sobre a gestão de recursos humanos das Agências Reguladoras e dá outras providências.

(Pontos de destaque, na visão de Ana Claudia Custódio)

Art. 4o As Agências serão dirigidas em regime de colegiado, por um Conselho Diretor ou Diretoria composta por Conselheiros ou Diretores, sendo um deles o seu Presidente ou o Diretor-Geral ou o Diretor-Presidente.
Art. 5o O Presidente ou o Diretor-Geral ou o Diretor-Presidente (CD I) e os demais membros do Conselho Diretor ou da Diretoria (CD II) serão brasileiros, de reputação ilibada, formação universitária e elevado conceito no campo de especialidade dos cargos para os quais serão nomeados, devendo ser escolhidos pelo Presidente da República e por ele nomeados, após aprovação pelo Senado Federal, nos termos da alínea f do inciso III do art. 52 da Constituição Federal.
Art. 8o  O ex-dirigente fica impedido para o exercício de atividades ou de prestar qualquer serviço no setor regulado pela respectiva agência, por um período de quatro meses, contados da exoneração ou do término do seu mandato(Redação dada pela Medida Provisória nº 2.216-37, de 2001)
§ 2o  Durante o impedimento, o ex-dirigente ficará vinculado à agência, fazendo jus a remuneração compensatória equivalente à do cargo de direção que exerceu e aos benefícios a ele inerentes. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.216-37, de 2001)
§ 3o Aplica-se o disposto neste artigo ao ex-dirigente exonerado a pedido, se este já tiver cumprido pelo menos seis meses do seu mandato.
Art. 16. As Agências Reguladoras poderão requisitar servidores e empregados de órgãos e entidades integrantes da administração pública.(Redação dada pela Lei nº 11.292, de 2006)
Art. 19. Mediante lei, poderão ser criados Quadro de Pessoal Específico, destinado, exclusivamente, à absorção de servidores públicos federais regidos pela Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990, e Quadro de Pessoal em Extinção, destinado exclusivamente à absorção de empregados de empresas públicas federais liquidadas ou em processo de liquidação, regidos pelo regime celetista, que se encontrarem exercendo atividades a serem absorvidas pelas Agências.
Art. 31. As Agências Reguladoras, no exercício de sua autonomia, poderão desenvolver sistemas próprios de administração de recursos humanos, inclusive cadastro e pagamento, sendo obrigatória a alimentação dos sistemas de informações mantidos pelo órgão central do Sistema de Pessoal Civil – SIPEC.
Art. 36. O caput do art. 24 da Lei no 9.472, de 16 de julho de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 24. O mandato dos membros do Conselho Diretor será de cinco anos."(NR)
"................................................................................."
Art. 37. A aquisição de bens e a contratação de serviços pelas Agências Reguladoras poderá se dar nas modalidades de consulta e pregão, observado o disposto nos arts. 55 a 58 da Lei no 9.472, de 1997, e nos termos de regulamento próprio.
Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica às contratações referentes a obras e serviços de engenharia, cujos procedimentos deverão observar as normas gerais de licitação e contratação para a Administração Pública.
Pontos de destaque segundo alguns doutrinadores:

Quanto a autonomia administrativa - dada a personalidade jurídica própria - as agências reguladoras contratam e administram em seu próprio nome, contrai obrigações e adquire direitos, mas dentro das regras de ordenamento vigente.

Quanto ao poder normativo, não abrange o poder regulamentar de leis, suas normatizações deverão ser operacionais, no sentido de regular sua própria atividade por meio de normas de efeitos internos, e conceituar, interpretar ou explicar conceitos jurídicos indeterminados contidos na lei, sem inovar na ordem jurídica.

Operam como instância administrativa final no litígios sobre matérias de sua competência, isso significa que, em princípio não cabe recurso hierárquico de suas decisões, exceto quanto ao controle de legalidade.

Os dirigentes possuem mandato com prazo de duração determinado.

Sujeição a controle ou tutela: como nas autarquias comuns, o controle feito pelo Ministério é um controle finalístico (supervisão ministerial), que visa mantê-la no estrito cumprimento de suas finalidades (tutela).

Regime de pessoal  - Lei 10.871/2004

 Art. 6o O regime jurídico dos cargos e carreiras referidos no art. 1o desta Lei é o instituído na Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990, observadas as disposições desta Lei.


Bons estudos! J
Caso você entre divergências, ficarei grata se avisar.
Ana Claudia Custódio.


Nenhum comentário:

Postar um comentário